Há museus a mais e estão cheios de obras de arte. Tempo de produzir pensamento crítico e convocar a comunidade
A crise chegou a todo o lado. O exemplo do que sucede nos chamados países emergentes, como o Brasil, Angola, ou a China, agravou o choque anteriormente vivido nas velhas democracias ricas e culturalmente avançadas da América e da Europa. Há um excesso de capacidade produtiva (criativa, no caso das artes), um excesso de obras de arte (que a subida dos preços imobiliários torna incomportável manter em reserva) e, em contraposição, menos dinheiro para produzir, menos dinheiro para expor, menos dinheiro para promover, e até um certo cansaço das velhas formas de consumir. Na metamorfose em que estamos desde o início deste século, multiplicam-se aflitivamente as vítimas colaterais, o downsizing é geral, anseia-se por alternativas e novas ideias. Talvez, como lucidamente propõe Marta Mestre, seja o momento de produzir pensamento crítico.
O pequeno paraíso criado pelo empresário mineiro Bernardo de Mello Paz, onde um extraordinário acervo de arte contemporânea convive com a arte da paisagem, talvez seja um dos lugares mais apropriados para promover um grande passeio filosófico sobre a razão da arte, e o tempo que aí vem. Marta Mestre será certamente capaz de ali convocar o pensamento crítico de que fala.
ANTÓNIO CERVEIRA PINTO
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ArtRio Pílulas de Arte com Marta Mestre from ArtRio on Vimeo.
Portugal e Brasil
VPF: Portugal e Brasil aparentam continuar distanciados, e os anos sucedem-se. Não me parece difícil verificar que o distanciamento cultural entre os dois países é um prolongamento da visão impossível do ‘fado tropical’! Na tua opinião “o que é que Portugal não tem” para se compatibilizar integralmente com o Brasil?
MM: O que Portugal não tem eu não sei…, mas eu costumo dizer que são dois países que falam a mesma língua, mas não conversam a mesma linguagem. Precisamos de nos traduzir mutuamente… Aliás, esse seria um bom exercício de curadoria, mais do que procurarmos as afinidades.
in Entrevista a Marta Mestre realizada por Por Liz Vahia e Victor Pinto da Fonseca
ARTE CAPITAL
Nova curadora: ‘Caminho de Inhotim é produzir conhecimento’
por Audrey Furlaneto
“Em dez anos, Inhotim consolidou sua vocação: é um grande museu, majoritariamente ocupado por instalações site-specific, que propõem a relação arte e natureza em projetos de grande escala. O espaço que se abre agora é o de adensamento crítico, de tentar produzir algum conhecimento e criar conexões teóricas, para que Inhotim não se reduza a um megaprojeto de artistas consagrados.” A avaliação é de Marta Mestre, recém-nomeada curadora de Inhotim, ao lado do americano Allan Schwartzman e do alemão Jochen Volz.
Aos 35 anos, Marta foi indicada ao cargo e passou por um processo de seleção até ser anunciada, na semana passada, a curadora in loco do megamuseu no interior de Minas — Schwartzman vive em Nova York e Volz, em São Paulo. A portuguesa, radicada há seis anos no Rio, tece um discurso pouco estridente para o museu em que tudo é grandioso — a área de Inhotim equivale à de 300 campos de futebol, e seu orçamento é de R$ 42 milhões ao ano.
Discreta, Marta não alardeia a criação de novos pavilhões nem a compra de obras ou a construção de projetos de escala espetacular. Defende que o momento do megamuseu é, agora, de “produção de pensamento crítico” […]
in O Globo, 16/03/2016 6:00 / Atualizado 16/03/2016 11:23
Marta Mestre/ Bios
Portuguesa. Vive e trabalha no Rio de Janeiro onde é curadora assistente no MAM Rio. Graduada em História da Arte [Universidade Nova de Lisboa, 2003] e Cultura e Comunicação/ Museologia [Université d’Avignon, Paris, 2005]. Faz crítica de arte e publicou em Arte y Parte (Santander), Dardo (Santiago de Compostela), Arte Capital (Lisboa), Concinittas (Rio de Janeiro). Coordenou o Centro de Artes de Sines [Portugal, 2005-2008] onde fez a programação de artes visuais e artes de palco, e foi curadora das exposições (seleção): A situação está tensa mas sob controlo [Artecontempo, Lisboa, 2005]; Estado de Atenção, [Casa da Cerca, Almada, 2010]; Terceira Metade [MAM RJ, 2011]; Rodrigo Souza Leão [MAM RJ, 2011], Novas Aquisições 2010-2012. Col. Gilberto Chateaubriand [MAM RJ, 2012]; É uma das curadoras do projeto Imago/Ymago que edita em Portugal os autores J. Rancière, Didi-Huberman, V. Stoichita, H. Belting e Aby Warburg.
Instituto Inhotim
O Instituto Inhotim é a sede de um dos mais importantes acervos de arte contemporânea do Brasil e considerado o maior centro de arte ao ar livre da América Latina.
[…]O Instituto Inhotim abriga um complexo museológico com uma série de pavilhões e galerias com obras de arte e esculturas expostas ao ar livre. O surgimento do Inhotim no cenário das instituições culturais brasileiras tem como marca, desde o início, a missão de criar um acervo artístico e de definir estratégias museológicas que possibilitem o acesso da comunidade aos bens culturais. Nesse sentido, trata-se de aproximar o público de um relevante conjunto de obras, produzidas por artistas de diferentes partes do mundo, refletindo de forma atual sobre as questões da contemporaneidade.
Inhotim é a única instituição brasileira que exibe continuamente um acervo de excelência internacional de arte contemporânea.
Graças a uma série de contextos específicos, Inhotim oferece um novo modelo distante daquele dos museus urbanos. A experiência do Inhotim está em grande parte associada ao desenvolvimento de uma relação espacial entre arte e natureza, que possibilita aos artistas criarem e exibirem suas obras em condições únicas. O espectador é convidado a percorrer jardins, paisagens de florestas e ambientes rurais, perdendo-se entre lagos, trilhas, montanhas e vales, estabelecendo uma vivência ativa do espaço.