Fernando Echevarría

Fundación Ortega MuñozPoesía, SO2

FERNANDO ECHEVARRÍA

Poemas

Cabezón de la Sal, Cantabria, 1929.


PAISAGENS

1
Fecha-se em neve o horizonte.
Adensa-se-lhe a clausura
sobre as árvores. O vento
baixou de repente. Inculca
uma inflação de silêncio
a ganhar o da caruma.
Os melros surdiram dentro
dessa grande fome escura
da noite. Toma-os, lentos,
uma letargia surda,
quase mais de pensamento
que de inércia. O que resulta
é um perto a encolher-se ao perto
e, por trás, sono, abertura.

2
Depois o nevão assenta.
Cresce em volume. A desoras,
o estudo da sonolência
toma seu vagar em conta.
E o ritmo vai caindo
enquanto sobe o nevão
da letargia nos ninhos
e no silêncio. Depois
há ainda a inteligência
a apaziguar-se no estudo
e a estender sua lenta
adequação sobre tudo.
Para, por fim, o vagar
tomar conta do nevão
e erguê-lo, intelectual,
a incremento de visão.

3
É liso o mar. O sol espelha a sua
superfície de luz. Ao fundo, espesso,
o cômputo plausível da negrura
só deixa adivinhar a paz do peso.
E, entre os dois, apenas a recusa
— a do brilho espelhado. Verdadeiro
por acima lhe vir realidade alguma,
a não ser a extensão do mar imenso.


Foi afastando-se. A idade
levava o afastamento
para mais longe. Onde quase
só crescia o seu acréscimo.
E era doce a paisagem
à frente. Atrás, o deserto
recolhia novidades
de um outro longínquo tempo.
Aí, respiravam-se ares
de quase só pensamento,
onde passarmos, passarem
nos levava para dentro
da grande felicidade
que era afastarmo-nos, vendo.


Tornou-se, aos poucos, sensível
a tez da velhice. A mágoa
recolheu-se ao doce timbre
de azular-se na palavra.

E a palavra desceu
ao halo feliz da tez,
com a velhice a crescer
dentro da luz que se fez.


Por trás das nuvens o azul é aberto.
Aquém, o escuro reproduz as casas
e a faixa fecunda dos pinheiros
a dar ao rio claridade abstracta.
A lisura também acusa o espelho
de uma imobilidade momentânea
mas, às vezes, com flechas de sol cheio
e incidências a luzir nas águas.
No entanto, o azul, por trás, é certo,
como a altura invisível da palavra
que o vai descobrindo ao intelecto
e o transpõe para a cidade santa.
Aí, o azul é ainda mais aberto.
Mais próximo de Deus. Mais à distância.


O fogo foi esse lugar desde onde
chegou a voz. Inconsumível sarça
lhe assinalava o ponto fixo. O enorme
poderio de ardência em que a palavra
também ardia, a proteger o nome
de uma divulgação promíscua. A chama
ensimesmava-se. E, por fora, o longe
tinha a urgência faminta da distância.
O privilégio distinguira o homem.
Abrira à escuta a alargação tomada
à do deserto, onde se funda a ordem
no hábito de haver recurso à alma.
E a escuta aberta iluminou a noite
enquanto a espessa nuvem da algazarra
conculcava arraiais, ao pé do monte.
A idolatria objectivou a magna
apetência animal. O ergueu conforme
ao seu apoucamento e à ira santa
de Moisés a brandir a luz que trouxe,
no relâmpago cúmplice das tábuas.